Celebra-se hoje o Dia Internacional dos Museus. Quase todos os museus nacionais tiveram uma programação especial e horário alargado até às 24horas, tudo completamente grátis, para além de livros com descontos, a preços muito convidativos.
Não podendo ir a todos, escolhi dois - O Museu Arpad Szenes Vieira da Silva e o Museu do Azulejo.

A obra de Vieira da Silva é por demais conhecida, mas será que o é a sua vida de apátrida, durante quase trinta anos? A pintora casou com Arpad, húngaro; ao tempo, a mulher portuguesa que casasse com um estrangeiro perdia automaticamente a nacionalidade portuguesa porque adquiriria a do marido (imagino - ou antes, dado o desenrolar da história, quero acreditar - que só assim não seria se a lei nacional do marido não previsse essa aquisição, caso em que se manteria a nacionalidade originária). Porque Arpad era judeu, teve que fugir da Hungria e perdeu a nacionalidade, perca que se comunicou a sua mulher. Em 1939/40, o Estado Português recusou-lhes a nacionalidade portuguesa. Dados os ventos de guerra que assolavam a Europa e a incerteza da posição de Portugal, o casal emigrou para o Brasil, onde passou 7 anos sem nacionalidade! No pós 2ª Guerra, tentaram, de novo, a atribuição de nacionalidade portuguesa e, mais uma vez, não conseguiram, agora porque Arpad era oriundo de um país da Cortina de Ferro, ainda que este tão pouco lhe reconhecesse a nacionalidade... Até que, nos anos 60, o Estado Francês lhes concedeu a nacionalidade francesa.
Não tenho palavras para expressar a vergonha que sinto por isto ter acontecido nem consigo imaginar como terá sido viver como pária e apátrida - sem chão, sem raízes, sem pertença...
Ficam aqui duas belas fotos que retratam o exterior de uma das mais belas praças de Lisboa (o jardim das Amoreiras) vistas do interior do museu.


Visitem-no, o Museu está a atravessar dificuldades e precisa de público para sobreviver e, afinal, uma entrada custa menos do que um bilhete de cinema...
A segunda parte do Programa foi no Museu do Azulejo - o único no mundo dedicado ao tema.
95% dos visitantes são estrangeiros. Isso mesmo, 95%, apesar de o museu ser gratuito aos domingos de manhã até às 14h e haver visitas guiadas só para portugueses que são grátis. O Museu tem igualmente um restaurante muito simpático, podendo no Verão ser usado o jardim interior para esse efeito. Além disso, fica num convento manuelino, fundado pela Rainha D. Leonor, que para aí se retirou quando enviuvou, e que sobreviveu ao terramoto. Tudo razões mais do que suficientes para o visitar.
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Aposentos de D.Leonor . tecto original |
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Aposentos de D.Leonor . chão original (e instalação de novos ceramistas) |
Hoje tinha um programa super-intenso (notava-se no cansaço dos funcionários e voluntários, absolutamente inexcedíveis) com visita à colecção, um concerto de guitarra clássica, um missa crioula e ainda a um espectáculo de mornas e coladeras (não assisti).
Houve igualmente a inauguração de exposição colectiva de jovens artistas que trabalharam em Alcobaça tendo produzido um acervo super-interessante, de que deixo algumas fotos.
Alguns nomes são conhecidos, outros nem tanto, mas inserem-se certamente numa corrente de arte popular que está a dar frutos e oxalá tenham tanto sucesso como a Joana Vasconcelos.
Aprendi que o barro preto não é feito com um tipo especial de argila mas apenas escurece porque durante o processo de cozedura se colocam no forno materiais que absorvem a água e tornam o barro negro (por exemplo, giestas...)

E também aprendi que a porcelana chinesa "bago de arroz" é mesmo feita com bagos de arroz, que se colocam na massa e que, quais pipocas, "incham" durante a cozedura, adquirindo aquela transparência muito própria.

A título de curiosidade, azulejo, etimologicamente, vem do árabe az-zulaiji, “pedrinhas lisas” e nada tem a ver com a cor azul. O facto de na época de ouro do barroco se ter utilizado primordialmente o azul teve a ver com a influência da porcelana chinesa que utilizava tais cores e que acabou por ditar a moda em todos os países europeus que andaram pela China (veja-se a porcelana de Delft).
Ficam uns apontamentos de trabalhos influenciados pelas nipónicas camélias (japoneiras, na minha terra), as minhas flores favoritas.
O chão da sala do cadeiral é cubista avant la lettre"...

Amanhã de manhã, e todos os Domingos do ano, os museus são igualmente grátis. É aproveitar! Porque a cultura não ocupa lugar e pode ser grátis.
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