MEMÓRIAS DE OUTONO
O fim de Setembro e a chegada do Outono
estão para mim indelevelmente associados à confecção de compotas. Isto acontecia na minha casa e em todas as casas que conhecia e visitava. Era comum, aliás, a troca entre amigas e conhecidas de pequenas tigelas de marmelada ou de frasquinhos de geleia de marmelo. Igualmente comuns eram as conversas entre as donas de casa sobre a melhor maneira de obter uma "marmelada branca" ou uma "marmelada vermelha". Algo que nos faz hoje sorrir, em que já não há donas de casa (não? eu não dei de conta de não o ser...) e que as trocas de impressões entre amigas versarão mais sobre "nails", temas do "face" e outras coisas que me abstenho de comentar...
Tenho muitas saudades desses dias e dias de grandes panelões ao lume, alguns de
cobre, em que se apuravam os pontos do açúcar até que atingissem a consistência
adequada à conservação das frutas que abundavam nesta época do ano e que, assim preparadas, durariam até ao próximo
Outono.
Seguiam-se outros dias em que
parapeitos de janelas e varandas se enfeitavam de tigelas de marmelada enxameadas
de abelhas gulosas, as únicas capazes de funcionar como antídoto adequado à minha gula e vontade de meter os dedos nas tigelas do doce tentador.
Passaram alguns anos desde que,
de espectadora, passei a personagem central na confecção de muitas e variadas
compotas.
Nos últimos quinze anos, por via
de alterações de regime alimentar, as compotas eram quase exclusivamente confeccionadas
para oferecer. Vou aproveitando a época dos marmelos para os preparar cozidos
ou assados, sem adição de qualquer açúcar. E adoro comê-los assim apenas
polvilhados com canela.
Até que, no ano passado aprendi,
com a Natália Rodrigues, do Instituto Macrobiótico, a fazer compotas de
melancia e melão sem açúcar. Dão trabalho, sobretudo a melancia por causa das
pevides, mas são facílimas de preparar – lava-se muito bem a fruta antes de a
abrir, cortando-se seguidamente em pequenos bocados, que se colocam em tachos
largos ou panelas altas, consoante a quantidade em causa.
Leva-se ao lume e deixa-se ferver
até a fruta reduzir sensivelmente para 1/3 do volume inicial (serão necessárias
cerca de 3 horas para o melão e de 5 horas para a melancia).
Enchem-se frascos quentes - e
preferencialmente pequenos – até cima, que de imediato se fecham com as
respectivas tampas (idealmente, a tampa deve inchar um pouco), voltam-se os
frascos ao contrário, que assim se mantêm durantes alguns dias.
Apesar de não terem outro açúcar
para além do da própria fruta, as compotas duram imenso tempo enquanto os
frascos não forem abertos; uma vez encetados estes, as compotas devem ser
consumidas no prazo de 4 ou 5 dias (daí a necessidade de serem frascos
pequenos) e guardadas no frigorífico.
* * *
Nesses dias de azáfama não havia muito tempo para grandes requintes na cozinha. Aliás, lembro-me de se aproveitar ocasiões em que, por qualquer motivo, só o "gineceu" estava em casa para levar a cabo a grande empreitada das compotas.
Quaisquer sobras de comida, engolidas muitas vezes de pé, serviam para alimentar as abelhinhas mestras rodopiantes em volta dos tachos fumegantes.
A refeição de hoje, arrumadas que estão as compotas de melão e melancia, poderia ser a de um desses dias de azáfama: uma lata de conservas de carapaus em óleo picante tem a carga proteica necessária e suficiente para carregar baterias; junte-se-lhe meia batata doce (à época seria uma bateria de batatas porque estávamos todas muito fraquinhas...) e uma cebola cozidas, com grelos salteados e temos uma refeição ultra-saborosa e muito nutritiva.
Com esta refeição participo, mais uma vez no desafio da Maria, do blogue [Limited Edition] - Passatempo Conservas Nero e [Limited Edition].
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